terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Onde estão os vaga-lumes ?


Dezembro chegou e o stress acumulado ao longo dos onze primeiros mêses parece transbordar nos semblantes e atitudes. As ruas enchem-se de automóveis, álibis perfeitos para condutores neurotizados e acossados por uma pressa sem início ou fim. E como zagueiro em final de carreira, estamos sempre atrasados; ao menos nos sentimos assim. O tempo todo. Então corremos sem parar para cumprir tudo o que pensamos ser importante, no espaço de tempo que imaginamos imprescindível.

Na verdade todos os mêses são assim, mas dezembro é especialmente estressante. Como se não bastasse os encargos normais de qualquer vida ordinária, o último mês do ano nos reserva as benditas festas de final de ano.

Já no início do mês tentamos criar o que achamos ser uma atmosfera especial que entendemos dever alimentar pois, afinal, como filhos de Deus devemos iluminar o que for possível para comemorar a chegada de seu filho mais notável. E o primeiro drama é encontrar aquela maldita caixa onde as luzes do natal passado foram guardadas.
Para quem mora em pequenos apartamentos, normalmente a tal caixa é acomodada sem sutileza alguma em qualquer canto em cima do roupeiro. Já quem mora em casas tem um trabalho extra pois as opções são mais variadas. Se, e quando finalmente a encontramos, o passo seguinte é ligar as luzes em qualquer tomada, só para nos certificarmos de que não estão funcionando pois invariavelmente uma entre as centenas de minúsculas lâmpadas está em curto. E umazinha já é suficiente para que todas as demais não funcionem. E assim passamos a testar lâmpada por lâmpada à procura da que impede as demais de brilharem. Como sempre, após horas de trabalho infrutífero nos rendemos aos fatos e saímos à procura da primeira loja de departamentos para comprar lâmpadas novas. E como não bastasse o suplício de ter que enfrentar lojas lotadíssimas, somos obrigados a escutar o disco mais deprimente de toda a história da discografia mundial: o disco de músicas natalinas da Simone. Acho que se as autoridades fosse mais responsáveis deveriam ter obrigado a gravadora a colocar uma tarja preta com a seguinte inscrição: evite escutar mais do que três faixas por dia. Essa simples medida evitaria boa parte da onda de suicídios que ocorre todos os finais de ano; que errôneamente são atribuídos ao tal de "balanço" que as pessoas dizem fazer nesse período. Isso é uma falácia ! Bastaria as autoridades policiais darem uma espiadinha no aparelho de som dos suicidas para ver que o disco da Simone estaria lá. Não custa lembrar que a maioria dos crimes não desvendados devem-se a pequenos detalhes negligenciados pelos investigadores. Com os suicídios não é diferente. Fecha parênteses.

Mas considerando que tenhamos sobrevivido à incursão pelas lojas, chegamos em casa e nos entregamos à instalação das lampadazinhas piscantes nos locais mais chamativos possíveis, mesmo que tenhamos que exercer virtudes acrobáticas que sequer imaginávamos ter. Entretanto sempre nos esquecemos de que este tipo de lâmpadas quando instaladas ao relento não devem permanecer ligadas quando chove. E sempre chove; e sempre temos que repetir toda a epopéia. E tudo isso por quê ?
Porque a natureza não consegue mais reproduzir aquele simpatissíssimo insetinho que todos os anos apareciam aos milhares em meados de novembro, atrás dos quais corríamos alucinados, quando criança, tentando capturá-los para os colocarmos dentro de um vidrinho. Claro que fazíamos furinhos na tampa para poderem respirar - e isso era o máximo de consciência ecológica que nossas cabeças infantis dispunham naquele momento. Certamente nos dias de hoje as crianças tem mais informações a respeito. Jamais colocariam um indefeso insetinho num vidro. O máximo que fazem é colocar seus amiguinhos de cabeça para baixo trancados num armário ou darem de chinelo na cara de seus pais, que acham isso a coisa mais engraçadinha do mundo.
Mas de qualquer forma, estou falando dos vaga-lumes, cujo plural correto é pirilampo. Quem tem trinta anos ou mais deve se lembrar. À noite espiávamos pela janela e lá estavam eles ziguezagueando com suas luzinhas piscando em suas caudas. Uma maravilha. Ao mesmo tempo ficávamos imaginando onde eles se escondiam o resto do ano pois suas aparições se davam entre novembro e janeiro. Nos outros nove mêses simplesmente desapareciam. A hipótese mais plausível era de que eram enviados pelo Papai-Noel que, passado o natal os levava para o pólo norte. Nunca tivemos certeza disso, mas queríamos loucamente acreditar.
Pois não é que aos poucos simplesmente foram discretamente desaparecendo e, quando dei-me por conta nunca mais os vi. Simplesmente sumiram. E restaram as burocráticas luzes artificiais piscando a cada intervalo de tempo milimétricamente programadas; sem magia alguma. Vaga-lumes tecnológicos num mundo cada vez mais virtual.

Um comentário:

  1. Puxa cara, eu que escrevo contos de fantasia, sempre me encanto com os pirilampos (Essa eu não sabia), como um simples inseto consegue transmitir luz?

    Tenho a felicidade de morar no meio do mato e agora no verão eles surgem as turbas, em tons verde-azulados, piscando pela noite aqui no meu recanto.

    Belo post. Um abç.

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