quarta-feira, 23 de junho de 2010

O assistente do word e os sub's.



O ato de escrever secretamente guarda lá suas particularidades. Alguns são mais formais, outros menos; outros tantos adoram firulas, ao passo que há quem prefira fazer gol mesmo que seja de bico. Enfim, cada qual com suas peculiaridades.
Por outro lado, deixando de lado questões de estilo, há também uma outra diferença crucial: escrever sob a supervisão do Word ou não. Eu, por exemplo, temia tanto o programa que escrevia direto no blog, sem qualquer correção eletrônica – o que explica eventuais erros ortográficos e, vez ou outra, até gramaticais. Sabem como é, aquele assistente do Word em forma de clipe, com seu par de olhos me cuidando o tempo todo, me dava arrepios. Reparem, parece uma espécie de censor esperando um mínimo vacilo que seja para, como um monstro, emergir da lagoa a qualquer momento. Não gosto disso! Me lembra o Golbery, o Médici, o general Newton Cruz ou, pior ainda, aqueles seus subalternos dos subalternos dos subalternos que ficavam vasculhando a tudo e a todos à procura de algo que fosse considerado subversivo. Mas evidentemente, os tais sub´s nunca souberam direito o que significava subversão. Digamos que para eles era um conceito complexo, isto é, além de suas faculdades intelectuais. Nem convinha ao regime, pois os militares foram os primeiros a subverter a ordem constitucional. Noves fora, em sua concepçãozinha, nem precisava; bastava ficarem atentos a qualquer coisa vermelha que se mexesse ou que tivesse de posse de algo onde constasse alguma palavra derivada de “comum”, tais como comunidade, comunicação ou comunista. Mais grave ainda, porém, caso fosse algo relacionado a Cuba. E Cuba era mesmo uma palavra-chave; qualquer referência à ilha era passaporte direto para o pau-de-arara.
A este respeito, consta que certa feita um senhor octogenário, de nome Antero Laudelino – músico da banda municipal de Nova Esperança do Itaiquara do Sul – lentamente retornava da inauguração do pau-de-sebo municipal vestindo com garbo indisfarçável a farda vermelha da banda. Subitamente seus orgulhosos passos foram brecados por um fusca vascaíno que lhes obstruiu o caminho. Desceram dois homens corpulentos, revistaram-lhe e, ao examinar os papéis que carregava, exclamaram: “Ahááá! Entra já no carro seu comuna filho-da-puta!” Na frente do delegado, orgulhosamente apresentaram sua caça e a prova: “Taí doutor, tem até prova por escrito!” “Esse vovô sem-vergonha escreveu tudo em códigos, mas dá pra entender que é sobre Cuba!” O delegado examinou, examinou e exclamou: “Seus imbecis, isto aqui não é código; é uma partitura musical!” O tolo mais ousado ainda tentou emendar, murmurando: “Mas doutor é sobre Cuba...” “Mas vocês são uns ignorantes mesmo. O velho toca tuba. Tuba, entenderam!?” Pois é, estes eram os subs dos subs dos subalternos; eram eles os assistentes de correção dos ogros ditadores. E nós, durante vinte e cinco anos ficamos todos à mercê dessas adoráveis criaturas.
Sei lá, mas acho que é por essas e outras que fico desconfortável com olhares vigilantes. Parece que algo absurdo poderá acontecer sem o menor aviso.
E este assistente do Word é um pouco isto. Neste exato momento, por exemplo, seus olhinhos voltam-se para o texto ao mesmo tempo em que dá uma coçadinha na sua “cabeça” como que procurando alguma razão para me espinafrar. Se ferrou. Está tudo certo.
Agora, tenho que dar a mão à palmatória: outro dia ele me passou uma amável carraspana, pois eu tinha por hábito sempre dar um espaço entre a última letra da frase e o ponto de exclamação ou de interrogação. Só faltou me perguntar por que razão não dou espaço para o ponto final. Nem precisou, ele delicadamente deixou margem para que eu mesmo concluísse.
Pensando bem, o assistente do Word tem suas vantagens sobre os sub-ditadores, pois além de ser muito mais simpático sabe exatamente o que fazer. E se limita a isso. Já os primeiros...

P.S. Caso achem algum erro, por menor que seja, culpem o assistente. Quem mandou ele se meter onde não foi chamado!

2 comentários:

  1. Engraçado, Jorge, eu costumo lidar bem com o assistente rs, mas uso muito os recursos "ignorar sentença" e "adicionar ao dicionário". É um dos motivos pq concordo mais ainda que o Word é mais simpático que os sub-ditadores. ;)

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  2. Genial.
    Eu uso o deus google pra tudo, ou seja, sem assistentes. na cara e na coragem. E no erro, inevitavelmente.
    Pô, lembrar do Golbery. Hehe... vou ter pesadelos hoje à noite.

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