quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Perdeste a chance!

Não te espero mais! Agora é tua vez, e recomendo paciência, eis que há de ser demorada a hora pois perdeste a chance de me levar em teus braços quando eu sequer cogitava a possibilidade; portanto, contra minha vontade. Ao menos naquele momento. Sei, chegaste bem pertinho, teu sopro quase me congelou naquela noite de um janeiro de calor abrasador. Nem bem sei o que pensei; só sentia que tu me rondava insidiosamente e eu não te queria, mas naquele momento pouco ou quase nada dependia de minha vontade; mais das pessoas de branco que mexiam em mim - tuas inimigas mortais. Não, melhor não dizer assim; elas brigam diariamente contigo para que tu faça o menor número de pontos possível. As vezes vencem, outras não. De qualquer forma, desta vez o objeto em disputa era eu.

Enquanto a batalha se dava, tão lúcido quanto a doce morfina permitia, eu olhava para o relógio da parede: 22:31 - um homem de branco com Deus nas mãos embrenha-se artérias adentro -, 22:32, 22:40, 22:41; 23:00, 23:01 - outro homem de branco ternamente afaga minha cabeça e pergunta se está tudo bem comigo, 23:02, 23:17, 23:18, 23:30, 23;31, 23:50...finalmente te impingiram a primeira derrota. Outras vieram depois, mas agora tu já não mais parecia tão autossuficiente.

Olha, dizem que tu adora pregar essas peças surgindo inesperadamente, ou nem tanto, mas agora é tarde, estou precavido e um passo a frente, ou vários, e não te quero mais como por vezes posso ter te dado a entender. Na verdade nunca foi minha vontade, apenas cansaços passageiros. Sempre soube disso, mesmo que nos momentos mais agudos tenha resistido a ti mais pelos que me amam do que por mim próprio.

Pois agora não te quero também por mim! Fique certa disso, caso antes não tenha ficado claro. E até qualquer dia. Sem pressa, pois teus negros cetins esvoaçantes não me seduzem mais!


O homem de branco com Deus nas mãos era o Dr. Christiano Barcellos. A ele minha homenagem e agradecimento.


Graduação Medicina Universidade de Passo Fundo-RS 1995;
Resid. Cir. Cardiovascular Instituto de Cardiologia-RS 1999;
Mestrado Ciências Médicas UFRGS/UPF - RS 2004;
Título Espec. Sociedade Brasileira Cir. Cardiovascular 2005;
Título Espec. Sociedade Brasileira Cardiologia 2007;
Título de Especialista pela Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista 2010.

Fone: (51)3230.2646

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Reducionismos

Vício...

em trabalho ou preguiça, em carne fresca ou carniça;

em repetição ou criação, em liberdade ou prisão;

em silêncio ou barulho, em fevereiro ou julho;

em multidão ou solidão, em esconder ou dar a mão;

em estudo ou ignorância, em aceitação ou intolerância;

em humildade ou megalomania, em apreço à autoridade ou anarquia;

em inércia ou movimento, em calçada de terra ou pavimento;

em realidade ou fantasia, em coragem ou covardia;

em bloqueios ou fluidez, em ir fundo ou perder a vez;

em castigar ou perdoar, em ter medo d’água ou nadar;

em bunda ou seios, em velocidade ou freios;

em perenidade ou metamorfose, em muitas ou numa só dose;

em sexo ou castidade, em vida no campo ou na cidade;

em dizer ou calar, em se abster ou julgar;

em religião ou ciência; em lucidez ou demência;

em baseado ou cocaína; em sedativo ou anfetamina

em descer ou subir, em ficar ou ir;

em misancene ou sinceridade, em equidistância ou extremidade;

em ponderar ou explodir, em voltar ou sumir;

em casa ou na rua, com roupa ou nua;

em simplificar ou sofisticar, em descobrir ou ignorar;

em luz acesa ou apagada; em saída ou chegada;

em guardar para si ou compartilhar, em abrir ou fechar;

em militar ou civil; em ir lentamente ou a mil

em ouvir ou ensurdecer, em manter a razão ou enlouquecer;

em saúde ou hipocondria, em poli ou monogamia;

em lembrar ou esquecer, em condenar ou compreender;

em vertical ou horizontal, no bem ou no mal;

em gerar ou abortar, em crer ou desconfiar;

em libertar ou prender, em matar ou morrer;

em cheirar ou exalar, em viver ou suicidar;

em desordem ou simetria, em noite ou dia;

em virtual ou real; em variações ou sempre igual;

em justeza ou vilania, em ditadura ou democracia

em inércia ou ação, em fato ou versão;

em desatino ou sensatez, na atual ou na ex;

em gordura ou magreza, em feiúra ou beleza;

em drogas lícitas ou não, em esconder ou expor a opinião

em comédia romântica ou terror, em ódio ou amor;

em impulsividade ou prudência, em opor, ou não, resistência

em sadismo ou masoquismo, em vanguarda ou conservadorismo;

em sagrado ou profano, em divindade ou humano;

em cautela ou impulsividade, em luxo ou simplicidade;

em separar ou unir, em chorar ou rir;

em mandar ou obedecer, em iluminar ou escurecer;

em vingança ou perdão, em dar vexame ou discrição;

em defender ou atacar, em ser alvejado ou atirar;

em cautela ou impulsividade, em falta de decoro ou honestidade;

em proletariado ou burguesia, em adrenalina ou calmaria;

em mainstream ou contramão, em defeitos ou perfeição;

em resistência ou entrega, em quem ouve ou quem prega;

em despir-se ou ser despido; em fazer por conta ou ser induzido;

em praia ou serra, em quem fica quieto ou berra;

em dizer sim ou não, em fazer sem pensar ou com programação;

em retas, em curvas, em sol, em chuva, em drogas naturais, em sintéticas, em ter, ou não, ética, em etiquetar, em concordar, em lamentar, em não querer ter vícios...

...em viciar.

Deixa estar!

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Até mais...

Passo por aqui não para pedir que vez ou outra também o façam, pois não sei ao certo quando eu mesmo me acharei numa condição bacana para fazê-lo. As vêzes acho que tudo parece mais próximo; e quase me jogo com a voracidade que segue a um longo jejum qualquer. Mas invariavelmente deixo para outra hora, como obviamente devem ter observado. De qualquer forma reconstruções são difíceis, mais complicadas do que se possa imaginar e, assim, a disposição continua do outro lado da rua, tão paralela quanto desafiadora. Ainda mais quando o alívio pelo vislumbre da linha de chegada é interrompido pelos dados quando nos colocam de volta quase no reinício do jogo. E realmente é uma merda quando isso acontece. Mas é preciso enfrentar o jogo para que ele não acabe definitivamente. E lá vou eu novamente, com a cara e a coragem que sequer sabia que tinha.


Bom, mas se não prometo data para voltar, deixo ao menos uma promessa: dia 31 de dezembro, pela primeira vez vou soltar um foguete, e será da pequena janela do meu apê; seguido de um gutural grito: 2011: vai pra puta-que-te-pariu!

segunda-feira, 7 de março de 2011

Segredos.

Não procuro em teu olhos caminhos para desnudar teus secretos pensamentos; eles são teus e, como tal, intransferíveis, de absoluta inexigibilidade por quem quer que seja. Nem mesmo o amor é chave suficiente que legitime a exigência de abertura para o que te é tão caro. Portanto, os segredos teus devem ficar contigo, e talvez a maior prova de amor que te possa dispensar seja mesmo deixar-te livre para guardá-los até que tenhas vontade de compartilhá-los, no todo ou em parte ou mesmo nada. Suspeito mesmo que nunca seja necessário os revelar, e o amor em nada será afetado, ainda que pareça paradoxal dizer-te que te amo mesmo que não te conheça por completo. E se amo mesmo assim, é o que basta!


Quanto a mim, não guardo tantos segredos quanto possa parecer. Talvez nem mesmo os tenha, ou, quem sabe, nem mesmo eu saiba que existam. Sim, é possível sermos o que não sabemos ser ou, dito de outra forma, acreditarmos sermos o que em realidade não somos - pelo menos na exata dimensão em que pensamos ter ciência -, além do que não deve ser em nada incomum perder-se em tantos papéis que desempenhamos quase que automaticamente em função de respostas que nos são exigidas. De qualquer forma, se amamos alguém, mesmo que na incompletude do que transparece, do que é percebível, que seja assim enquanto suficiente. E se um dia não mais for, não será pela parte oculta. Ao contrário, a revelação é que pode complicar tudo.

Heroína.

Não busco em tuas dilatadas pupilas respostas que não podes me dar, heroína.
Tampouco as artérias tão azuis conseguem indicar por onde andas nestas horas em que flerto com os abismos que indicas, heroína, sem medo do que pode ou poderia ser ou talvez nem fosse o caso. De qualquer sorte, nesses pequenos espaços onde deixas a porta entreaberta, espero poder vê-la intacta quando exaurirem teus encantos, a não ser que optes por enfeitar teus lençóis com pétalas de sangue. Mas se pudesse dizer-te algo, heroína, diria que estas pétalas são tão efêmeras quanto golfadas de vento de ontem, que simplesmente deixam de existir pois o tempo se encarrega de escondê-las transformando o que eram em nada. E nada de nada vale a pena, heroína, sabes muito bem disso. Ou deveria. A questão é que muitas vezes o insucesso é a vitória que o momento nos impede ver em sua plenitude o que, curiosamente, só a derrota nos permite saboreá-la.
Mas quão difícil é ultrapassar a luz que parece só produzir sombras quando as cores esperadas estão escondidas por ti, heroína. Heroína de tantos e falsos encantos como fake de Veríssimo ou de tantos outros.

domingo, 6 de março de 2011

Exposição: Mulheres que marcaram época.


Olá amigos!

Gostaria de convidá-los para uma visita à exposição "Mulheres que marcaram época".
das artistas plásticas Regiane Bassani e Sandra Honors, e curadoria de Silvia Godoy.
A Exposição ficará de 01/03 a 05/04 de 2011 no Hotel Mercure Paulista.
Av. São Carlos do Pinhal, 87 Bela Vista São Paulo - SP

Um pouco sobre o projeto "Mulheres que marcaram época"
O Projeto pretende despertar a atenção das pessoas, para o fato de que muita coisa mudou com relação à posição das mulheres nas sociedades modernas, mas, sem dúvida alguma, muitos avanços ainda se fazem necessários até que estas sejam reconhecidas em toda sua verdadeira grandeza e importância, na construção de uma sociedade justa e digna.
As artistas plásticas, Regiane e Sandra, escolheram algumas mulheres que marcaram época, por sua beleza, graça, inteligência, talentos artísticos, força, determinação, bondade, carisma, mas que, como qualquer ser humano , enfrentaram barreiras, preconceitos e uma série de obstáculos que precisaram ser superados.
Assim, além de grandes mulheres, tornaram-se igualmente fonte de inspiração para todos nós!



IV- JUSTIFICATIVA:
Precisamos promover constantes debates e reflexões, pois ainda que muitas conquistas tenham sido consolidadas ao longo dos anos, ainda hoje, mulheres são diariamente violentadas, surradas, discriminadas e mortas, de forma cruel, banal e sem sentido.
O dia 8 de março foi a data escolhida pelas Nações Unidas como o dia Internacional da Mulher. Época em que nos lembramos de todas as nossas conquistas nas esferas política, econômica e social. Mas, apesar de todos os avanços e vitórias, muito ainda precisa ser feito até que sejam vencidos todos os preconceitos e violência sofrida pelas mulheres.
Essas reflexões devem ocorrer não apenas na época em que normalmente festejamos o dia Internacional da mulher, mas em todos os outros meses do ano!
A Exposição “Mulheres que marcaram época” é uma exposição Itinerante, idealizada para percorrer diversos espaços ao longo do ano.
Ao retratarem essas 20 mulheres em suas obras, as artistas tentam mostrar como é possível diante do sofrimento, adversidades, críticas, oposições e dificuldades, ressurgirmos inteiras, fortes, atuantes e vencedoras e mudarmos o curso da nossa história.
Não poderei lá estar, mas estarei mesmo não estando, até mesmo quando as portas forem fechadas e as luzes apagadas, admirando e guardando cada pincelada das criações da Regi e da Silvia.
P.S. Breve voltarei ao blog, como de resto a tudo o mais. Por hora sigo me reformatando, o que, acreditem, não é pouco.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Beijos de chumbo na terra da liberdade.

Apenas algumas mãos descobertas dos encardidos lençóis em plena avenida, e um bando de mórbidos pares de olhos fumegantes de mortos-vivos silenciosamente aplaudindo, com suas palmas de aço, o resultado da cena protagonizada por mais um maluco-fascistóide qualquer e sua pistola 9mm com o cano ainda quente pelos disparos em seqüência até a última bala do pente. Pronto! Alguém mais resolveu por conta própria fechar as cortinas de outros. O eterno fascínio pela solução final, sem chance de defesa ou contraponto. Simples assim. Não, não digo que todos o convidariam para um jantar em família; talvez preferissem deixá-lo educando suas crianças durante as férias de verão. Sabem como é, um bom norte-americano precisa desde cedo aprender a atirar para defender-se dos inimigos que julgam ter e ser um bom republicano temente ao deus que acreditam tê-los ungido como o "povo escolhido". Aliás, às crianças criadas sob este manto de medo só são permitidos solilóquios com seus amiguinhos imaginários na primeira infância; tempos felizes que precedem a fábrica de inimigos, imáginários ou não, que os acompanhará pelo resto de seus dias. Um fenômeno coletivo, muito antes de ser algo individualmente construído. Na raiz da formação deste imaginário coletivo encontra-se a história dos EUA que foi desvelada assim, sempre com a contraposição a algum mal que causasse temor , ao que deveriam responder com o extermínio. Nesta dança macabra, sem que fossem convidados com um mínimo de gentileza, entraram indígenas, inglêses, mexicanos, negros, comunistas, árabes e, para deixar claro que o inimigo pode estar cortando a grama do jardim ao lado, vez ou outra fazem alguns presidentes entrarem para a história cheirando pólvora. Mas neste último caso, invariavelmente os escolhidos são políticos de matizes menos reacionárias, comparando-se com o que (não)pensa o repúblicano-cristão médio. E dê-lhe solução a bala! Nesta lógica, Mark Chapman achava John Lennon hipócrita. O que fazer? Assassiná-lo, é óbvio. Ato isolado de um maluco ou apenas mais alguém seguindo a linha de pensamento do estreito leque de opções para solucionar impasses? Os constantes massacres em escolas parecem seguir a mesma lógica.
E assim, contraditóriamente, e forçando um pouco a barra, o fascismo - aqui entendido como solução de força - foi e continua seduzindo grande parte da população na "terra da liberdade", pois lhes parece ser perfeitamente democrático substituir a aceitação do contraditório e do diferente por estalar de beijos de chumbo. Quem será o próximo?

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Coisas de casal.


Quatro horas da madrugada. Um movimento tão brusco quanto inesperado acorda Paulão de seus picantes sonhos com a musa de sua longínqua adolescência: Helena Ramos.

- Bem!? Bem!? Behnhê!!! Acorda!
- Hã, o que foi?
- Me chama de "minha pandinha"?
- Como assim? Que papo é esse a essa hora?
- É, me chama de "minha pandinha"...
- Lucimaura, são quatro horas da madrugada. Porque isso agora?
- É que nós já estamos casados há sete anos...
- E daí?
- Daí que não temos nenhum apelido secreto.
- Mas isso é hora, Lu-ci-mau-ra!!, responde Paulão, provocativamente acentuando a terceira sílaba.
- Não me chama assim que eu não gosto!
- Tá bem, eu te chamo do que tu quiser, mas me deixa dormir.
- Não! Acorda, Paulão!
- Pô, não dá para ver isso amanhã?
- Não, tem que ser agora!
- Se eu disser, tu me deixa dormir?
- Não, tem que soar verdadeiro, íntimo. Além disso tem que ser algo em que tu me reconheça, enfim, uma secreta referência para me chamar para o resto de nossas vidas em nossa intimidade.
- Mas é tão urgente assim? E para o resto de nossas vidas? Agora, no meio da noite? E além disso, tu já escolheu!?
- Não te faz, Paulão! Diz, diz, diz...
- Tá bom! Me deixa dormir, minha pandinha?
- Não!
- Mas não era isso o que tu queria?
- Tu continua te fazendo de desentendido! Nós precisamos entrar num acordo. Todos os casais fazem isso.
- Mas as quatro da manhã?
- E por acaso tem hora para isso?
- Tu esperou sete anos e agora tem que ser agora? Vai, me deixa dormir, minha pandinha.
- Assim não, tá soando falso!
- Ah, meu deus!
- Sem essa de "ah, meu deus". Tu só tá falando para poder voltar a dormir. A prova disso é que nem perguntou do que vai querer que eu te chame.
- Pelo meu nome tá bom: Paulão.
- Não, temos que achar um apelido pra ti também. Que tal peposo?
- Enlouqueceu? Imagina tu ligando para o meu trabalho perguntando pelo peposo?
- Eu não faria isso. Para os teus amigos sempre te chamarei de Paulão, no máximo Paulãozinho.
- Pois é, mas tu nunca ouviu falar em ato-falho? Basta tu te enganar uma só vez para me ferrar para todo o sempre, amém! Quem sabe gladiador ou exterminador?
- Benzinho, tem que ser algo carinhoso, no diminutivo.
- Sei, tu quer algo meio tatibitati, né? Só para me desmoralizar...
- Como é que tu pode dizer uma coisa dessas, Paulão?
- Sei lá, vai ver que tu tá na crise dos sete anos...
- Paulão, casamentos entram em crise aos sete anos; não esposas.
- Mas comigo está tudo certo; quem está reclamando é tu!
- Eu não estou reclamando. Só quero um apelidinho bonitinho, carinhosinho, que seja uma síntese do nosso amorzinho.
- Ah, já entendi!, diz Paulão - tirando a velha camiseta do Inter que usa para dormir desde o campeonato brasileiro invicto de 1979 - tentando, a seu modo, demonstrar sua síntese do seu amor por Lucimaura.
- Pára, Paulão! Tira a mão daí! Estou falando sério! Tu acha que isso sempre resolve tudo...
- Ah, minha pandinha, tu bem sabe que os pandas estão em extinção. Então...
- Paulão, eu odeio quando tu me trata assim...
- Deixa disso, minha pandinha...chega pra cá...
- Tudo bem, Paulão. Amanhã vou trocar meu guarda-roupa inteirinho com teu cartão de crédito!
- Ok, você venceu! Agora vem cá com teu exterminador.
- Não vou e não quero mais saber dessa história.
- Deixa disso, minha peposinha.
- Tá vendo, Paulão. Tu nunca me leva a sério.
- Mas o que foi que eu fiz agora?
- Me chamou de peposinha.
- Não era o que tu queria?
- Tudo bem, Paulão, vá dormir. Mas não esqueça de deixar o cartão de crédito em cima da mesa. Vou aproveitar e comprar alguns pares de sapatos também.
- Não, agora sou eu que não quero dormir!
- Não te faz, Paulão!
- Como não!? Se quero fazer amor contigo tu diz que isso não é jeito de resolver as coisas. Mas gastar com roupas e sapatos é?
- Você não entende nada de mulheres mesmo! (sinal de perigo: Lucimaura só troca o tu por você quando está extremamente irritada).
Paulão lê bem o sinal, mas não resiste a tentação de ter a última palavra:
- Será que é por isso que escolhi casar contigo, Lu-ci-mau-ra?
- Pro sofá! Pro sofá! Seu filho da mãe! Miserável!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Tráfico e consumo de drogas implicam necessariamente em violência?

Óleo sobre tela

Era uma vez um reino no qual uma côrte imperava a séculos e mais séculos e mais séculos. Entretanto, nem sempre fôra assim. Antes dela, pessoas desfrutavam livremente destas terras. Mas após a côrte por aqui aportar tudo ficou diferente: a prática da subjugação e a conseqüente dominação para que se viabilizasse a exploração virou método para administrar o reino. Pois foi precisamente este método que ficou inculcado no imaginário das côrtes que sucederam a predecessora. E como eufemismos sempre foram uma poderosa arma retórica de dominadores, com o tempo o termo côrtes passou a ser substituído por elites. De qualquer forma, a côrte/elite passou a permitir a existência de uma sub-côrte - com pouco poder mas com um nível de vida agradável e, sobretudo, com rara possibilidade de ascensão social. Mas o medo da mobilidade para baixo na escala social a manteve fiel à côrte imperial. Com o passar do tempo surgiram sub-sub-côrtes, as quais foram proliferando o que, até certo ponto, era bastante lucrativo às camadas "superiores" da sociedade à medida em que o modo de produção escravista foi sendo substituído pelo capitalista. Entretanto a mentalidade escravista da côrte/elite permaneceu intacto. Poucas décadas antes do final do século XX, parte dessas sub-sub-côrtes transformaram-se em sub-sub-sub-côrtes. Uma parcela deste extrato passou a comercializar pílulas de felicidade - que haviam sido tornadas ilegais no início do mesmo século - mas que todos os extratos deste pequeno mundo adoravam consumir. Todavia, mesmo assim esses vendedores não conseguiam ascender socialmente e tornaram-se cada vez mais violentos. Mas porque raios tinha que ser assim? Em outros reinos onde também havia côrtes - mas não sub-sub-sub-côrtes - os tais vendedores de pílulas também existiam mas a violência não imperava, ao menos não com tal virulência? Aliás, em muitos destes reinos boa parte das pílulas podiam ser consumidas livremente, o que reduzia as possibilidades de lucro de seus comerciantes. Mas independentemente de parte das pílulas serem ou não ilegais, naqueles reinos a convivência social jamais tornou-se tão violenta como por estas bandas. De qualquer forma, por aqui, a situação encaminhava-se para um impasse: os sub-sub-sub/traficantes já não mais respeitavam nem seus comuns e muito menos os sub-sub, os sub e, tampouco, a côrte propriamente dita. Mais do que isso, passaram a os odiar e, assim, a atacá-los frontal e desafiadoramente. Foi neste momento que a côrte imperial passou a intervir em suas atividades, ao que a parte dos sub-sub-sub envolvida com o comércio das pílulas revidaram. Instalou-se um aparente caos ou, dito de outra forma, o cenário de sua ocorrência transbordou às áreas por onde os sub-sub e os sub transitavam. Com a transparência do horror, a sociedade passou a exigir medidas enérgicas, as quais efetivamente foram tomadas. Assim, toneladas de bolinhas de papel e rolos de fitas adesivas (armas genuínamente brasileiras com alto poder de fogo) foram despejadas sobre os sub-sub-sub, intimidando-os, como a sociedade exigiu.


E justamente neste contexto muitos palpiteiros passaram a emitir suas opiniões, muitas vêzes carentes de maior profundidade: uns achando necessário a aniquilação completa dos vendedores; outros a dos consumidores; outros tantos a dos dois ou, ainda, de todos os sub-sub-sub, etc. etc. Porém, entre todas, causou-me espécie a ausência de um exercício sempre salutar quando se quer realmente entender os processos em sua integralidade: o estudo comparativo. Considerando que o consumo de tais pílulas da felicidade é uma atividade comum a todos os cantos desse nosso maltratado planeta desde quando não eram ilegais, porque em alguns reinos a situação transforma-se neste caos e em outros não? E, de outro, nos últimos tempos pílulas mais sofisticadas passaram a ser comercializadas não mais pelos sub-sub-sub, mas pelos sub-sub e, não raro, pelos próprios sub. Porém, nestes casos, a violência não assume as proporções do que ocorre nas áreas de atuações dos sub-sub-sub. Porque será? A resposta é tão singela quanto parece ser misteriosa aos palpiteiros: os sub-sub-sub são sub-produtos maltratados e frutificam em áreas onde a exclusão social e todos os efeitos dela decorrentes são desanimadores, ainda que apenas uma pequena parte dos excluídos se tornem violentos criminosos.

Trocando em miúdos: alguém acredita que o tráfico de drogas não existe na Alemanha, Espanha, Noruega, Canadá e outros tantos países socialmente menos desequilibrados? Mas no Brasil, no México e na Colômbia, por exemplo, o panorama de violência é tão semelhante entre si quanto diametralmente oposto ao que ocorre na Europa. Porque será? A resposta está no exame da raíz do problema. Porém, para chegar até aí é preciso olhar não apenas o que é aparente, o que está na superfície pois, como sabemos todos, as raízes ficam abaixo da nossa possibilidade de visão imediata. E nem sempre parte das sociedades dos reinos está disposta a vê-las pois, de seu exame, poderão surgir verdades inconvenientes.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Dia Internacional da Tolerância: que bom seria se...

Sendo o Dia Internacional da Tolerância, abri os jornais de hoje esperando ver as seguintes manchetes:
- Talibã curte férias com esposa em praia de nudismo;
- Republicanos aglutinam esforços para construção de busto em homenagem a Fidel Castro;
- Muçulmanos, católicos e judeus abandonam Jerusalém e vão a festa rave juntos;
- PT e PSDB abandonam seus aliados e formam nova coalisão;
- João Pedro Stédile e Ronaldo Caiado combinam natal em família;
- Indústria bélica norte-americana fecha as portas e patrocina novo woodstock, revitalizando valores da contracultura;
- George W. Bush aceita ser alfabetizado por Tiririca;
- Movimento Tradicionalista Gaúcho divulga manifesto em favor do casamento gay e da alimentação vegetariana;
- Membros da Ku Klux Klan transferem sede do movimento para a África, visando aumentar comunhão étnica;
- Latifundiários paraenses desarmam seus jagunços trocando armas por caixinhas de música;
- Skinheads, reunidos numa sinagoga, confirmam participação na próxima Parada Gay, ao mesmo tempo em que lançam "luta" pela transformação do Dia da Consciência Negra em Semana da Consciência Negra;
- Banqueiros brasileiros abrem mão de seu quinhão na dívida interna brasileira em prol de políticas públicas para erradicação da pobreza;
- Negros calçando chinelos deixam de ser seguidos por seguranças de shoping's.
- ONU delibera sobre fim de arsenais nucleares: "Se todos não podem ter, ninguém os terá!"
- Mulheres em postos de chefia abandonam "modo masculino" de chefiar e implantam a doçura;
- Anti-tabagistas radicais refletem sobre seu nem sempre saudável estilo de vida deixando, desta forma, a histeria de lado;
- Na praia de Pinhal, veranistas deixam de "socializar" seus funk's, house's e pagodes, baixando o volume de seus potentes aparelhos para que todos pudessem ouvir Beethoven vindo de um automóvel que por ali passava;
- Diretores de empresas abandonam ternos e gravatas e passam a trabalhar com camisetas, bermudas e bonés, abandonando as distinções de classe;
- Gisele Bünchen declara: "Magreza e beleza não são sinônimos!" E vai ao mercado comprar caixas e mais caixas de leite condensado.
- Sobre o último Gre-nal, colorados declaram: "foi penalti pro Grêmio!" gremistas discordam: "nosso jogador estava impedido!"
- Rede Globo anuncia cobertura eqüidistante do próximo pleito eleitoral;
- Papa Bento XVI anuncia apoio a Frei Leonardo Boff à sua sucessão;
- Católicos e protestantes irlandeses abandonam discórdias seculares e unem-se em torno da doutrina do Santo Daime;
- Gentileza no trânsito torna tecnologia de controladores de velocidade sem utilidade e derruba estatísticas de acidentes;
- Marido traído diz que ama esposa e que tudo continuará como antes. Ops, aí já é tolerância demais! Ou não?

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

COMO MORCEGOS À LUZ DO SOL


Aqui estou. Lambendo as palavras, que escorrem trôpegas pelas tubulações cerebrais numa enxurrada de imagens e caracteres inexistentes no teclado, resultado de mais uma noite onde flerto com os morcegos e com o silêncio da cidade que dorme. Não sei bem se dorme; apenas acho. As pílulas, antes amigas, solicitam novas amizades, novas associações, numa chantagem farmacológica que se repete com frequência aos que que "sonham" com o sono reparador da noite que separa o dia.
Entretanto, enquanto a solução não emerge, mais uma noite em que apenas escorreram pela garganta como balas de goma.

Enquanto isso, no cérebro, de dois em dois minutos soa silencioso o gongo escondido entre as reentrâncias encefálicas, cumprindo a rotina de micro-despertares que impedem os ciclos de completarem suas funções. Olhos cerrados e o cérebro alerta...
Hora de acordar! Me nego! Não interessa, os comandos não estão ao meu alcance.
A lua já se encontra com o sol anunciando um novo dia, o que deveria ser o anúncio do fim de um período e início de outro. Negativo. Nada começa, pois nada termina. Um moto-contínuo mantém o estado-de-alerta ininterruptamente. Não há ciclos; apenas permanência. Mas os ponteiros seguem em todos os lugares demarcando, dividindo a vida. Se ao menos parassem de vez em quando... Mas não, ficam ali, incidiosamente a lembrar os compromissos que devem ser cumpridos a despeito de o corpo e a mente reclamarem o sono inalcançado. Mas não tem jeito, o mal-estar segue tomando conta, os trajetos a serem trilhados e os trabalhos a serem executados. E assim sigo carregando a dificuldade do inexorável, as vêzes cambaleantemente acompanhado pelo medo de não chegar. Como um morcego à luz do sol.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Pela mais ampla liberdade de expressão: "contra o golpismo midiático e em defesa da democracia".

Eis a íntegra do documento do Centro de Estudos Barão de Itararé, lido durante o ato que lotou o auditório do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo na noite desta quinta-feira, 23 de setembro:
O ato “contra o golpismo midiático e em defesa da democracia”, proposto e organizado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, adquiriu uma dimensão inesperada. Alguns veículos da chamada grande imprensa atacaram esta iniciativa de maneira caluniosa e agressiva. Afirmaram que o protesto é “chapa branca”, promovido pelos “partidos governistas” e por centrais sindicais e movimentos sociais “financiados pelo governo Lula”. De maneira torpe e desonesta, estamparam em suas manchetes que o ato é “contra a imprensa”.
Diante destas distorções, que mais uma vez mancham a história da imprensa brasileira, é preciso muita calma e serenidade. Não vamos fazer o jogo daqueles que querem tumultuar as eleições e deslegitimar o voto popular, que querem usar imagens da mídia na campanha de um determinado candidato. Esta eleição define o futuro do país e deveria ser pautada pelo debate dos grandes temas nacionais, pela busca de soluções para os graves problemas sociais. Este não é momento de baixarias e extremismos. Para evitar manipulações, alguns esclarecimentos são necessários:
1. A proposta de fazer o ato no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo teve uma razão simbólica. Neste auditório que homenageia o jornalista Vladimir Herzog, que lutou contra a censura e foi assassinado pela ditadura militar, estão muitos que sempre lutaram pela verdadeira liberdade de expressão, enquanto alguns veículos da “grande imprensa” clamaram pelo golpe, apoiaram a ditadura – que torturou, matou, perseguiu e censurou jornalistas e patriotas – e criaram impérios durante o regime militar. Os inimigos da democracia não estão no auditório Vladimir Herzog. Aqui cabe um elogio e um agradecimento à diretoria do sindicato, que procura manter este local como um espaço democrático, dos que lutam pela verdadeira liberdade de expressão no Brasil.
2. O ato, como já foi dito e repetido – mas, infelizmente, não foi registrado por certos veículos e colunistas –, foi proposto e organizado pelo Centro de Estudos Barão de Itararé, entidade criada em maio passado, que reúne na sua direção, ampla e plural, jornalistas, blogueiros, acadêmicos, veículos progressistas e movimentos sociais que lutam pela democratização da comunicação. Antes mesmo do presidente Lula, no seu legítimo direito, criticar a imprensa “partidarizada” nos comícios de Juiz de Fora e Campinas, o protesto contra o golpismo midiático já estava marcado. Afirmar o contrário, insinuando que o ato foi “orquestrado”, é puro engodo. Tentar atacar um protesto dos que discordam da cobertura da imprensa é tentar, isto sim, censurar e negar o direito à livre manifestação, o que fere a própria Constituição. É um gesto autoritário dos que gostam de criticar, mas não aceitam críticas – que se acham acima do Estado de Direito.
3. Esta visão autoritária, contrária aos próprios princípios liberais, fica explícita quando se tenta desqualificar a participação no ato das centrais sindicais e dos movimentos sociais, acusando-os de serem “ligados ao governo”. Ou será que alguns estão com saudades dos tempos da ditadura, quando os lutadores sociais eram perseguidos e proibidos de se manifestar? O movimento social brasileiro tem elevado sua consciência sobre o papel estratégico da mídia. Ele é vítima constante de ataques, que visam criminalizar e satanizar suas lutas. Greves, passeatas, ocupações de terra e outras formas democráticas de pressão são tratadas como “caso de polícia”, relembrando a Velha República. Nada mais justo que critique os setores golpistas e antipopulares da velha mídia. Ou será que alguns veículos e até candidatos, que repetem o surrado bordão da “república sindical”, querem o retorno da chamada “ditabranda”, com censura, mortos e desaparecidos? O movimento social sabe que a democracia é vital para o avanço de suas lutas e para conquista de seus direitos. Por isso, está aqui! Ele não se intimida mais diante do terrorismo midiático.
4. Por último, é um absurdo total afirmar que este ato é “contra a imprensa” e visa “silenciar” as denúncias de irregularidades nos governos. Só os ingênuos acreditam nestas mentiras. Muitos de nós somos jornalistas e sempre lutamos contra qualquer tipo de censura (do Estado ou dos donos da mídia), sempre defendemos uma imprensa livre (inclusive da truculência de certos chefes de redação). Quem defende golpes e ditaduras, até em tempos recentes, são alguns empresários retrógrados do setor. Quem demite, persegue e censura jornalistas são os mesmos que agora se dizem defensores da “liberdade de imprensa”. Somos contra qualquer tipo de corrupção, que onera os cidadãos, e exigimos apuração rigorosa e punição exemplar dos corruptos e dos corruptores. Mas não somos ingênuos para aceitar um falso moralismo, típico udenismo, que é unilateral no denuncismo, que trata os “amigos da mídia” como santos, que descontextualiza denúncias, que destrói reputações, que desrespeita a própria Constituição, ao insistir na “presunção da culpa”. Não é só o filho da ex-ministra Erenice Guerra que está sob suspeição; outros filhos e filhas, como provou a revista CartaCapital, também mereceriam uma apuração rigorosa e uma cobertura isenta da mídia.
5- Neste ato, não queremos apenas desmascarar o golpismo midiático, o jogo sujo e pesado de um setor da imprensa brasileira. Queremos também contribuir na luta em defesa da democracia. Esta passa, mais do que nunca, pela democratização dos meios de comunicação. Não dá mais para aceitar uma mídia altamente concentrada e perigosamente manipuladora. Ela coloca em risco a própria a democracia. Vários países, inclusive os EUA, adotam medidas para o setor. Não propomos um “controle da mídia”, termo que já foi estigmatizado pelos impérios midiáticos, mas sim que a sociedade possa participar democraticamente na construção de uma comunicação mais democrática e pluralista. Neste sentido, este ato propõe algumas ações concretas:
- Desencadear de imediato uma campanha de solidariedade à revista CartaCapital, que está sendo alvo de investida recente de intimidação. É preciso fortalecer os veículos alternativos no país, que sofrem de inúmeras dificuldades para expressar suas idéias, enquanto os monopólios midiáticos abocanham quase todo o recurso publicitário. Como forma de solidariedade, sugerimos que todos assinemos publicações comprometidas com a democracia e os movimentos sociais, como a Carta Capital, Revista Fórum, Caros Amigos, Retrato do Brasil, Revista do Brasil, jornal Brasil de Fato, jornal Hora do Povo, entre outros; sugerimos também que os movimentos sociais divulguem em seus veículos campanhas massivas de assinaturas destas publicações impressas;
- Solicitar, através de pedidos individuais e coletivos, que a vice-procuradora regional eleitoral, Dra. Sandra Cureau, peça a abertura dos contratos e contas de publicidade de outras empresas de comunicação – Editora Abril, Grupo Folha, Estadão e Organizações Globo –, a exemplo do que fez recentemente com a revista CartaCapital. É urgente uma operação “ficha limpa” na mídia brasileira. Sempre tão preocupadas com o erário público, estas empresas monopolistas não farão qualquer objeção a um pedido da Dra. Sandra Cureau.
- Deflagrar uma campanha nacional em apoio à banda larga, que vise universalizar este direito e melhorar o PNBL recentemente apresentado pelo governo federal. A internet de alta velocidade é um instrumento poderoso de democratização da comunicação, de estimulo à maior diversidade e pluralidade informativas. Ela expressa a verdadeira luta pela “liberdade de expressão” nos dias atuais. Há forte resistência à banda larga para todos, por motivos políticos e econômicos óbvios. Só a pressão social, planejada e intensa, poderá garantir a universalização deste direito humano.
- Apoiar a proposta do jurista Fábio Konder Comparato, encampada pelas entidades do setor e as centrais sindicais, do ingresso de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) por omissão do parlamento na regulamentação dos artigos da Constituição que versam sobre comunicação. Esta é uma justa forma de pressão para exigir que preceitos constitucionais, como o que proíbe o monopólio no setor ou o que estimula a produção independente e regional, deixem de ser letra morta e sejam colocados em prática. Este é um dos caminhos para democratizar a comunicação.
- Redigir um documento, assinado por jornalistas, blogueiros e entidades da sociedade civil, que ajude a esclarecer o que está em jogo nas eleições brasileiras e que o papel da chamada grande imprensa tem jogado neste processo decisivo para o país. Ele deverá ser amplamente divulgado em nossos veículos e será encaminhado à imprensa internacional.

terça-feira, 14 de setembro de 2010


Tortura - óleo s/eucatex - 40 x 30

Fico perplexo quando algum conhecido viaja para o exterior e volta deitando falação a respeito do país visitado. Claro, refiro-me àquelas pessoas que, em tom quase professoral, fazem relatos como se a breve incursão fosse suficiente para que dominassem a história, as relações sociais, de poder, de dominação, enfim, as peculiaridades que conformam e fazem aquele país ser o que é. Mas, é claro, as pessoas não o fazem por mal. Elas acreditam que seus parcos dados sejam suficientes. Mesmo assim, fico com vontade de pular fora na primeira oportunidade.
Ora, essas mesmas pessoas via de regra mal conseguem ultrapassar o senso comum a respeito do local onde vivem e se acham capacitadas e instrumentalizadas para explicar o que se passa em outros países.
Por que estou falando tudo isso? Por uma razão muito singela: até mesmo esse tipo de pessoa sabe que estamos em meio a um processo eleitoral, embora nem sempre tenha claro o que está em jogo, que forças políticas, econômicas e sociais estão por trás desta ou daquela candidatura, que visões de mundo as explicam e patatí, patatá.

A questão é que já recebi um sem número de e-mails “acusando” a candidata Dilma Rousseff pelo seu passado de luta contra a ditadura militar. Acreditem, isto está sendo usado com peça desabonatória. Mais ainda, com alguma repercussão negativa para ela, ou seja, há quem veja nisso uma razão para não votar nela. Ora, qualquer um que habite este país deveria saber, no mínimo, que houve uma ditadura militar que durante vinte anos submeteu o país às trevas, torturando, assassinando, caçando direitos políticos, enfim, fechando todos os canais de interlocução não só da sociedade para com o Estado mas com ela própria. Pois foi neste ambiente que pessoas – enquanto a maioria alienadamente esfregava suas gordas bundas no sofá comprado no crediário, na esteira do “milagre brasileiro” – resolveram abrir mão de suas vidas ao decidirem entrar para a clandestinidade para enfrentar os sanguinários coturnos e todo o seu gigantesco e sem limites aparato repressivo. E, pior, maioria esta que, além de sequer saber o que se passava, vez ou outra até delatava os que se atiravam de peito aberto contra os regimes discricionários. Nem se trata de discutir se foi ou não a opção adequada ao momento – embora opções fossem praticamente inexistentes -, mas sim de louvar o ato de entrega de si pela maioria.
Mas a despeito deste desconhecimento e/ou falta de memória histórica, essas pessoas lutadoras existiram não só no Brasil, como na Argentina, no Uruguai, no Chile, enfim, em praticamente toda a América Latina que, à época, era banhada pelo verde-oliva que transformava opositores (ou quem achavam que fosse) em vermelho-sangue.
É justamente por isso que me causa estranheza quando estes idealistas que conseguiram sobreviver à tortura, a uma vida miseravelmente clandestina são condenados por parte da opinião pública a despeito de terem se doado por ideais coletivos e tendo enfrentado todos aqueles canalhas armados que vicejaram como inço naquele período.
Ah, mas houve assaltos a bancos! Ora, essas ações não eram voltadas ao enriquecimento pessoal, mas sim como fonte de financiamento das atividades que julgavam necessárias à libertação do país. Se a estratégia era certa, ou não, é outra história. Agora, convenhamos, alguém está com peninha dos bancos!? Poupem-me disso!
De qualquer forma, é justamente este desprendimento que me encantou (e segue como tal) durante minha juventude, razão pela qual serei eternamente grato aos que lutaram contra todos os regimes autoritários da época. Foram, são e sempre serão meus heróis. Aliás, acho que a humanidade tem uma dívida histórica para com todos eles que, mundo afora, lutaram contra forças militares que investiram barbaramente sobre seus próprios povos.
Agora, tem uma coisa: nem todos os que lutaram continuam na mesma trincheira. Obviamente há os que mudaram de lado e hoje defendem o capital. Destes posso até discordar no que se refere às suas posições atuais, o que não apaga os méritos de outrora. Querem um exemplo? Fernando Gabeira. Ele sofreu todas as agruras possíveis, comuns aos que ousaram heroicamente enfrentar ditadores, e hoje apóia a candidatura Serra que, como sabemos, está intimamente ligada ao histórico jeito de governar de nossas elites. Isto apaga seus méritos passados? Acho que não, embora discorde completamente de suas posições atuais.

Portanto, não passem o ridículo de enviarem-me e-mails utilizando esta linha de argumentação, pois jamais deixarei de votar em alguém por ter sido um lutador contra a ditadura militar. Ao contrário, este é um ponto positivo, embora não suficiente.
E é por isso que faço esta brevíssima recuperação histórica pois, ao que parece, há quem não conheça o país que habita e, por isso mesmo, são poucos exigentes quanto aos argumentos para votar ou deixar de votar neste ou naquele. Mas acham que podem compreender, conhecer e explicar outros países onde passaram suas férias.

E como imagens muitas vezes são mais eloqüentes do que palavras, preparei uma listinha com alguns filmes que retratam estes períodos de ditaduras militares no cone sul:

Brasil:
- Pra frente, Brasil –
- Lamarca –
- Batismo de sangue –
- Zuzu Angel –
- Araguaya – Conspiração do silêncio –
- Cabra marcado para morrer –
- Jango (o filme) –
- O que é isso, companheiro? –

Chile:
- Missing – Desaparecido, um grande mistério
- Chove sobre Santiago

Uruguai
- Estado de sítio

El Salvador:
- Salvador: martírio de um povo
- Vocês inocentes

- Z (Grécia)

Argentina:
- La historia oficial
- Las madres de la Plaza de Mayo
- Los pasos perdidos
- La noche de los lápices


segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Nem Deus nem o diabo entendem de casamento!



Portal - OST - 60 x 70

Numa de suas tantas e geniais crônicas (Até que a morte...) Rubem Alves narra uma conversa com o diabo. Há quem diga ter sido fictícia, mas como já vi muito bluesman cedendo sua alma ao demo em troca de performances inesquecíveis, de pronto acreditei que de fato ocorrera.
Segundo Ruben, o teor do colóquio deu-se em torno da origem central da discordância entre Deus e o diabo: qual o laço que manteria unidos homem e mulher para todo o sempre, amém.
Deus teria defendido a tese de que o amor seria a fonte que manteria a coesão ad eternum. Já o diabo teria retrucado dizendo que o amor é “cola fraca” e, portanto, transitório pois nele vive o maior inimigo da estabilidade: a liberdade. E sendo ela presente, a qualquer momento um amor enfraquecido poderia ser trocado pela ilusão de um novo amor. Já o ódio, segundo o diabo, traz consigo um conteúdo de permanência pois dele emana a negação da possibilidade de deixar o outro buscar a felicidade junto a outros amores, pelo que cada qual preferiria manter a união mesmo que a custo da própria felicidade - o que mais importaria seria manter a infelicidade do outro.

Embora tenha rejeitado parte da tese Dele, rebelei-me sobretudo contra a diabólica tese do ódio. Resolvi tomar uma atitude. Liguei para o secretário do diabo e pedi para marcar uma audiência.
- Alô?!
- “Secretário Mall Huff falando...”
- Gostaria de marcar uma audiência com o diabo.
- “Impossível! Nesta época de eleição o homem está muito ocupado”, disse-me Mall
- Mas estou com um pouco de pressa. É importante, tentei argumentar.
- “Neste caso, posso até te passar na frente, mas...”
- Sem mas, Sr. Mall Huff. Sendo assim, eu espero. Marca para quando for possível.
Longos meses se passaram até o dia do esperado encontro com o famigerado.
No dia e hora marcados, lá estava eu. O secretário anunciou-me. Entrei na imensa sala, assustadoramente forrada com um carpete vermelho até o teto, inclusive. Sentei-me à frente do dele. Ao contrário do que descrevera Rubem Alves, achei o diabo um tanto quanto andrógeno. Sei não, pensei. Nervoso, acendi um cigarro.
- “Apague!”, ordenou-me com a voz empostada, tentando me colocar na defensiva.
- Mas até o senhor...?
- “Sim, até eu! Não quero cheiro de fumaça por aqui. E senhor é Ele, disse-me, apontando o dedo para cima.”
Constrangido, apaguei o cigarro na saliva e guardei-o no bolso. Bom, mas eu vim aqui para...
- “Eu sei por quê você veio. Não pense que é só Ele que sabe tudo o que se passa. Eu também sou onipresente e onisciente.”
- Pois então está bem. Como tu bem sabes, nego-me a aceitar que o ódio seja o amálgama que sedimenta as relações entre homens e mulheres. Se assim fosse, porque razão se casaria?
- “Pela ilusão do amor e por sexo fácil e seguro.”
- Não creio, sexo nunca foi tão acessível. E para segurança existem os preservativos, contra-argumentei.

- “Tu estás esquecendo que quando homens e mulheres casam, normalmente estão embriagados pela paixão, que os cega.”
- Discordo, disse-lhe, pois até chegarem a ponto de decidirem casar-se, a paixão normalmente já foi ultrapassada pelo que chamamos amor. E o amor, sabemos, é a superação do vôo cego a que outrora estavam submetidos os apaixonados. E assim, a razão torna a fazer parte de seus horizontes.
- “Tudo bem, mas até agora tu ainda não provaste que não é o ódio que torna perene os relacionamentos.”
- Ora, seu demônio, parece-me óbvio que o homem é um ser histórico e, como tal, é naturalmente um observador dos fatos, mesmo que vez ou outra repita erros cometidos. Entretanto, este tipo de recorrências normalmente diz respeito a fatos que envolvem um grande número de pessoas.
- “Não entendi”, disse o diabo.
- Vou te dar um exemplo: por acaso não é comum vermos políticos corruptos serem sucessivamente reeleitos?
- “Sim, mas estes não só são meus protegidos como sempre dou uma forcinha extra quando preciso”, argumentou com indisfarçável garbo.
- Tu estás completamente enganado, diabinho. As pessoas o fazem ou por distração, ou por falta de informação, ou por indução mesmo, ou seja, não observam com o esmero que devotam a casos que lhes parece dizer diretamente respeito – embora eu entenda que a política diz tanto respeito às pessoas quanto o casamento.
- “Está bem, mas onde entra o casamento e o ódio?”
- Calma, meu sulfúrico rapaz (senti que estava dando as cartas e, por isso, cresci na parada). O que quero lhe dizer é que grande parte das pessoas aprende com as experiências dos outros pelo método da observação pura e simples. Claro, às eleições nem todos dão o devido valor e, por isso, cometem erros. Já em relação ao casamento a coisa muda de figura. Qualquer um tem inúmeros exemplos à sua disposição, com fartos elementos a serem observados. Ora, sendo o casamento algo que diz respeito clara e diretamente a vida de todos – ou quase todos -, é natural que prestem maior atenção ao que ocorre nele nos exemplos mais próximos. Correto?
- “Sim, mas e daí?”, murmurou o maléfico.
- Simples: se o ódio fosse realmente a razão pela qual os casais permanecem juntos, seus efeitos, sendo visíveis, seriam facilmente observáveis. Quem, então, casaria estando ciente do profundo mal-estar que um tipo de relação desta provoca? Tu bem sabes que poucos o fariam. E nem me venha com a idéia de que os sádicos se casariam. Eles até existem, mas são poucos. E vocês não brigaram por poucos, não é?
- “Agora tu me pegaste. Mas então tu achas que Deus está certo?”
- Bom, eu acho que Ele chegou mais perto. Os casais se juntam por uma série de razões, entre as quais o amor é a motivação preponderante. E permanecem por ele ligados, embora também por outras questões, todas elas motivadas pelo prazer, ou seja, jamais pelo ódio pois deste apenas resulta sofrimento. Portanto, o ódio nem de longe guarda qualquer relação com a perenidade ou não do casamento. Ao contrário, ele seria sua ruína.
- “É, mas o número de divórcios só está aumentando...”
- Pois é justamente o que dá mais força ao meu ponto de vista.
- “Não entendi de novo.”
- Olha só: como as mulheres adquiriram sua independência financeira ao entrarem definitivamente no mercado de trabalho, passaram a separar-se quando o ódio começa a fazer parte da relação. E os homens, por sua vez, passaram a fazer o mesmo pois sentem menos culpa ao irem embora. E assim ambos vão em busca de novos amores, ou seja, ninguém mais se submete a aturar o outro quando a coisa não vai bem. Entendeu?
- “Sim, mas nosso plano era de que os casais deveriam ficar juntos até que a morte os separasse... E quanto a isso Ele e eu concordávamos plenamente.”
- Pois é justamente aí que vocês se atrapalharam e acabaram brigando por nada.
- “Olha o respeito!”
- Eu sei que é duro aceitar isso, mas a verdade é que vocês brigaram por algo absolutamente sem sentido. A questão é que tu e Deus estão por aí desde sempre, então ficam imaginando coisas para a vida toda das pessoas a partir das suas noções de tempo. Ora, para nós uma vida inteira só não é muito quando o casamento vai bem; ao contrário, se vai mal, a perenidade se torna intolerável.
Então, se aceitas um conselho, procure Deus e humildemente proponha a Ele o que nós mortais vez ou outra fazemos: discutam a relação. Quem sabe vocês não chegam a conclusão de que está na hora de vocês pararem com essas picuinhas. Afinal, para mim parece claro: vocês não entendem nada de casamentos.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Não-fumantes X fumantes: é preciso ser assim?

Uma verdadeira onda de histeria coletiva gradativamente tem tomado conta do Brasil – e se trata de um fenômeno que não se vê tanto na Europa quanto nos demais países latino-americanos. Na Argentina e em Portugal, por exemplo, as relações são muitíssimo mais civilizadas. Falo da intolerância crescente de parte de uma parcela significativa dos não-fumantes em relação aos fumantes.
Aparentemente impulsionada pela rejeição ao tabaco em face da sua indiscutível nocividade, mas que, se examinarmos as atitudes práticas das pessoas não-fumantes em relação a sua própria saúde, fica bastante claro que este apartheid guarda motivações nem sempre tão claras quanto parecem. Talvez seja movido por uma intolerância oriunda de possíveis traços autoritários de personalidade – mesmo que inconscientes - do que qualquer outra real motivação. Mas isto é apenas uma hipótese. De qualquer forma, este apartheid fica tão mais claro quanto cada vez se torna mais comum verificar que aos fumantes sequer é concedida a possibilidade de aplacar seus sofrimentos, resultantes da abstinência da nicotina e do alcatrão, em locais separados ou mesmo em prosaicas janelas. Os anti-fumo radicais parecem não se sensibilizar, simplesmente expelem os “fumantes-canalhas” dos prédios comerciais, pouco interessando se faz frio intenso, chuva ou calor saárico. Fodam-se, parece ser a mensagem; quem mandou serem viciados! Que fumem na rua! Sei não, mas não me causaria espécie se num futuro próximo os fumantes venham a ser apedrejados em praça pública, ao melhor estilo da República Islâmica do Irã. Falta apenas a primeira pedra... E ao que parece, mãos não faltarão.
Mas eu falava da inconsistência da afirmação da razão para a segregação em função da preocupação com a saúde que os fumantes passivos dizem ter.
Aqui no Rio Grande do Sul, por exemplo, 48% da população é obesa (no Brasil são 46%) em função dos péssimos hábitos alimentares e do sedentarismo contumaz, o que revela que a preocupação com a saúde não é tão evidente assim. E neste contexto, é bastante comum sedentários ostentando imensas quantidades de gordura abdominal – aquele tipo que se desloca facilmente às artérias, obstruindo-as – dando discursos ferozes contra os fumantes, do alto de uma condição moral que não tem; ou, ainda, hipertensos - beberrões confessos – cerrando fileiras ao lado dos histérico-xiitas. Os mais ferozes críticos dos fumantes que conheço são exatamente assim: desenvolvem hábitos/estilos de vida nada saudáveis, mas mesmo assim não se furtam em censurar quem fuma, radicalizando as relações. Obviamente o rabo dos outros é mais colorido, é claro. Aliás, essa é uma das características que em nada engrandece as pessoas: ausência de auto-crítica que, quando conjugadas com a incapacidade de examinar as questões para além da superficialidade, resultam no que aí está.
Outro exemplo que demonstra que a preocupação com a saúde é uma falácia: no inverno passado, com o vírus H1N1 ceifando vidas a todo o momento no sul do país, era absolutamente comum encontrar andares inteiros de prédios comerciais hermeticamente fechados, sem uma frestinha sequer pela qual o ar pudesse ser trocado. Onde estava a preocupação com a saúde? Enfim, exemplos de atitudes incompatíveis com quem se diz preocupado com a saúde abundam. Mas enfim...
Quanto aos ex-fumantes – que hoje engrossam o coro dos histéricos-xiitas – cabe apenas uma breve observação: a sorte deles é que quando fumavam ninguém fez com eles algo remotamente parecido com o que eles hoje fazem com os atuais fumantes. E olha que em suas épocas fumava-se até em elevador. Mais estranho ainda, os não-fumantes da época pareciam realmente não se importar sequer com o cheiro. Hoje até em lugares ao ar livre é bastante comum ver pessoas recriminando fumantes. Ou seja, pegaram os fumantes para Cristo.
De qualquer forma, não pretendo ser louco o suficiente para defender a tese absurda de que se deva fumar. O cigarro é extremamente nocivo à saúde; que isso fique bem claro. O que chamo a atenção é de que os níveis de dependência que o cigarro impõem amarras dificilmente superáveis. Quem diz são os especialistas. Portanto, também é uma questão de um mínimo de humanidade que se administre as relações de forma mais civilizada. Alternativas existem. A barbárie não é a única, como parece ser.

Por fim, neste conexto de relações conflituosas - e forçando um pouco a barra- pode-se dizer que surgiram duas novas categorias sociais: fumantes e não-fumantes. Construindo-se, então, uma linha a partir destes dois tipos-ideais e colocando-os um em cada extremidade, teríamos algo mais ou menos assim: numa ponta os fumantes e, na outra, os não-fumantes, sendo que a aproximação maior de uma e outra extremidade determina o grau de intolerância quanto a possibilidade de convivência civilizada entre ambos. Então, por um lado temos os fumantes radicais, que não admitem qualquer forma de regulação quanto ao seu vício e, do outro, não-fumantes que, por sua extrema intolerância, chamarei de histérico-xiitas. O ponto zero, indica um maior grau de civilidade nas relações do conflito de interesses de ambas as partes.
Em que ponto da linha você se encontra?

I____________________________0___________________________I
Fumantes........................Civilização................Anti-fumantes radicais...................................................... histérico-xiitas

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Caretice.

Sem nome - OST - 80 X 60



Não espere aplausos meus à caretice que dá contornos à tua segurança; sempre avisei para deixar teus medos na portaria e abraçar a morte que nos acompanha desde o berçário. Sei, os manuais parecem garantir uma condução estável a tua trajetória de vida, entretanto o preço é a negação das possibilidades, e isso é demais, ao menos para mim. Mas, é claro, não pretendo aviar receita alguma - sequer as tenho para mim -, mas rejeito, e que isto fique bem claro, as tuas; o preço é demasiado alto para o que espero, que é simplesmente evitar que óleos conservadores impregnem as asas que me carregam em meu vôo, por mais cego que seja. E talvez seja este meu horizonte: aproveitar as brisas para lançar-me com todo o vigor, mesmo que seja para enfrentá-las quando for de meu gosto (ou não), por minha conta e risco. E é justamente isto que tua caretice bíblica impede ao negar quando o que mais espero é o sim.
Então fique com a aridez com que espera alcançar os prazeres na eternidade e deixe-me aqui buscando meus oásis imediatos, sem culpas, ao contrário do destino que resolveste construir para ti. A escolha é tua; a minha, já fiz.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

É o fim do casamento?



Univertango: OST 60 x 40

Há muito tempo as sociedades – sobretudo no ocidente - procuram de todas as formas frear os impulsos poligâmicos de seus membros - e antes que a confusão se estabeleça, por membros, entenda-se pessoas. E este ímpeto conservador tanto é verdadeiro que, para reforçar as uniões, deixá-las quase que indestrutíveis, desde há muito são realizadas em duas frentes: o casamento perante o onipotente, onisciente e onipresente Deus - por estas bandas representado por uma infinidade de prepostos de todos os tipos que, em comum, sempre deixam claro que a união tem que valer até a morte - e, por outro lado, pela letra fria de um aparato judicial que tudo faz para torná-las quase indissolúveis. Somado a tudo isso, um terceiro e simbólico elemento que serve como alerta a possíveis pretendentes: um aro de metal enfiado no dedo anular da mão esquerda. E a tal aliança é um artifício diabólico: basta que o sujeito engorde dois gramas para que sua condição civil fique marcada ad eternun. Se bem que conheci um sujeito que, para não correr este risco, usava uma pequena tira de feltro por baixo da aliança. Questionado pela esposa, dizia: “amorzinho, é para proteger a inscrição de nossos nomes da ação do ácido úrico”. E ela docemente acreditava; ou fazia de conta.
Mas o tempo passou e, pelo menos no que se refere à união civil, as amarras foram sendo afrouxadas. No Brasil, em 1977, depois de um embate tenebroso, o divórcio virou lei. Mas uma série de condicionantes ainda permaneceu fazendo parte do cenário, dificultando o desfecho. Pois agora, 33 anos depois, o divórcio passou a ser quase que instantâneo. Novamente os setores mais conservadores bradaram: “é o fim do casamento e, por extensão, da família!” Não acredito nisso! Além do que é cem por cento certo que o divórcio está umbilicalmente ligado ao casamento. Portanto, o número de casamentos deve mesmo aumentar.
De qualquer forma o que tem que ficar claro é que tudo isso não passa de subterfúgios artificiais – absolutamente ineficazes - para manter o “sagrado” matrimônio.
Penso que as pessoas deveriam fazer como meu camarada Antônio: após dezoito casamentos – um deles com a Elizabeth Taylor – criou o que chama de os dez mandamentos de Antônio para seu casamento não afundar:

1) Condicionar os ouvidos a funcionarem no modo stéreo: o da direita para ouvir as reclamações e o esquerdo para, concomitantemente, prestar atenção na narração do jogo de futebol;

2) Sempre passear de mãos dadas: a esposa voltada para o lado de fora da calçada, de forma a dificultar o acesso visual às vitrines e, por conseqüência, das compras;

3) Configurar a agenda do celular para que, em hipótese alguma, sejam esquecidas datas fundamentais: aniversário de namoro, do primeiro beijo, da primeira vez, de noivado, de casamento, dela própria, da sogra e do gato Ron-ron;
4) Antes de sair para o trabalho, disfarçadamente fotografá-la para, ao retornar poder dar uma conferidinha, tornando viável identificar aquela mecha de cabelos que ela resolveu pentear para o outro lado;

5) Jamais comprar roupas que fiquem apertadas, tampouco largas demais. Qualquer menção quanto a alterações de peso pode despertar seus mais selvagens instintos;

6) Nunca, mas nunca mesmo, chamá-la de mãe.

7) Não cochilar durante as apresentações de balé daquele obscuro grupo da periferia de São Petersburgo;

8) Dormir em camas separadas em épocas de T.P.M. Ela em sua confortável king-size e você na casa de praia;

9) Dar total apoio quando ela decidir fazer cursos de biscuit, reike, bijuterias, maquiagem, etc.; e

10) Não compará-la à sua mãe.

O Antônio garantiu que não vai precisar casar-se novamente. Sei não, aposto que a esposa dele deve ter sua própria relação de mandamentos. Pelo sim, pelo não, siga, adapte, construa seus próprios mandamentos. E se não der resultado, divorcie-se e case novamente; uma hora vai dar certo. Seja lá o que isto signifique. E boa sorte!