quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Descriminalização da maconha: mas por quê mesmo a criminalizaram ?


A Suprema Corte Argentina descriminalizou o uso de maconha em pequena escala nesta terça-feira (25.08.2009). "Todo adulto é livre para tomar decisões sobre o estilo de vida sem a intervenção do Estado", disse o documento judicial. O mesmo já acontecera no México na sexta-feira 21.08.2009. O assunto é complexo mas deve ser colocado na pauta do dia sem temores e amplamente discutido sem idéias preconceituosas. Por idéias preconceituosas, entenda-se idéias preconcebidas, ou seja, concebidas anteriormente ao exame racional do tema. É bom deixar isso bem claro.

Logo que fiquei sabendo da notícia lembrei-me de uma série de documentários apresentados há alguns anos pelo canal fechado GNT e que tratavam do assunto, sobretudo a partir das motivações que levaram à criminalização do uso de drogas e dos mecanismos envolvidos.

Em primeiro lugar é importante lembrar que até então o uso de drogas jamais fora proibido na história da humanidade. E mesmo com todas as preemências sanitárias e médicas a humanidade se reproduziu. Incrível.

Bem, mas comecemos a recuperação histórica.

Em 1917 foi apresentado ao Congresso dos EUA o Projeto da Lei Seca, que entrou em vigor em 1919. Em estando em vigor, duas foram as conseqüências mais imediatas: em primeiro lugar o surgimento do mercado paralelo (produção e tráfico do produto proibido). Em segundo, a criação de toda uma estrutura estatal para combater o que fora proibido. Óbvio. À frente desta mega-estrutura estava o Sr. Herbert Hoover (guardem esse nome). Aí se faz necessário um parênteses. Cada vez que são criadas estruturas estatais seja lá para o que for, deve-se ter em mente que, quando preciso, será dificílimo acabar com elas. Claro, elas são compostas não apenas por estruturas físicas, mas sobretudo por pessoas. Pessoas que são investidas de poder e, com este, estabelecem relações no interior e fora do aparelho estatal. Então, em resumo: a proibição e consumo do álcool teve duas conseqüências práticas: a criação de uma estrutura ilegal voltada a produção e tráfico do produto por um lado e ,de outro, a criação de uma gigantesca estrutura estatal para combater o que passara a ser crime.
Mas a tal substância continuou a ser consumida. Por quê ??? Porque a sociedade continuou a consumir o produto a despeito da sua proibição, pois qualquer sociedade é heterogênea o suficiente para que exista uma parcela significativa que sempre estará disposta a consumir determinadas substâncias, mesmo que declaradas ilegais em dado momento histórico. Simples assim. E vamos combinar que não dá para prender todo mundo.

Bom, mas em 1933 Roosevelt resolveu por bem acabar com a tal Lei Seca. As conseqüências foram duas: a falência de boa parte do crime organizado em torno da produção e tráfico do produto e, em segundo lugar, uma estrutura estatal que ficava sem função alguma.
E os beberrões ? Continuaram a fazê-lo tanto quanto o faziam antes ou durante a proibição. Mas e a estrutura ?

Como o Sr. Hoover tornara-se um homem poderoso, influente inclusive no interior do Congresso, não ia deixar barato. Claro, se a estrutura fosse destruída ele também o seria. Qual a solução ??? Pensem dez segundos.

Parabéns, isso mesmo: proibir outra coisa. Genial. Mas o quê ??? Já chego lá.

Naquele tempo existia um magnata chamado Willian Hearst, que sabia o significado do poder de se ter um veículo de comunicação nas mãos. E ele tinha vários. Aliás, se vocês puderem assistir o filme Cidadão Kane, de Orson Wells, saibam que o filme satiriza exatamente esse senhor, mesmo que Wells tenha negado. Willian era poderoso prá caral...

No seu belíssimo currículo está o fato de ter sido o expoente do que nos EUA chamam de "jornalismo amarelo". Aquela velha história da manipulação de fatos de tal forma a satisfazer interesses diretos ou indiretos do proprietário do veículo. Indiretos ? Sim, algo mais ou menos como agradar a alguém ou alguns. Isso pode ser de uma utilidade... Mas Deus nos livre disso !!! Ainda bem que não temos isso por aqui...


Mas voltando aos fatos, o tal Sr. Hearst era um incitador contumaz de ódios às minorias. Uma de suas proezas foi ter apoiado os nazistas nos anos 30. Sem dúvida uma bela criatura...Mas ele tinha seus alvos prediletos: os mexicanos e a maconha. Existem algumas teorias a respeito das motivações econômicas sobre as quais teria que me alongar muito. Independente de qual, explicam mas não justificam. Que fique claro isso. No fim trata-se de preconceito contra uma população. O que é tão abominável quanto preconceito racial, por exemplo.
O que ele fez foi usar todos os seus veículos: 28 jornais, 18 revistas, não sei quantas cadeias de rádio e uma produtora de cinema. Só isso. E tratou de demonizar os mexicanos dizendo que eram preguiçosos, ladrões, de caráter frágil, que gostavam do Sarney, que não gostavam do Roberto Carlos e patati patatá...,e...e...e...
fumavam marijuana. Fumavam e ficam endiabrados. Notem que mudou até o nome: sai maconha, entra marijuana. Marijuana ficava um nome, digamos, mais mexicano. E a população foi sendo convencida até que...

- Yeah, yeah, yeah, achamos um inimigo !!!
Sempre lembrando que o norte-americano médio adora um inimigozinho, que se lambe.
- Meu Deus, como não me dei conta antes ? pensou aquela tradicional dona-de-casa norte-americana. E eles aqui no quintal cortando grama ! E todos dopados. Cruzes.
- John, chama as crianças prá dentro !!! E já !!!

Pronto, na mosca. Estava tudo empacotadinho.
Aí, quem entra na história ??? Uma dica: alguém com o mesmo sobrenome dele foi o "cara" da CIA por décadas e mais décadas - o primeiro nome era Edgar. Lembrou ?
Herbert Hoover. Ele mesmo. O cara que tinha um grande poder, influência e toda uma estrutura para combater qualquer coisa que fosse declarada ilegal. E que estava de férias desde que a Lei Seca acabara. Mas estava louquinho da Silva prá voltar a trabalhar. Então só faltava achar alguma coisa para proibir. William achou por ele.
Agora era só terminar de convencer o Congresso e acertar alguns detalhes. Bingo !!!

E assim proibiu-se a maconha. Num primeiro momento, pois posteriormente proibiu-se outra série infindável de substâncias. Estava, assim, criado o novo modelo para tratamento de substâncias psicoativas: a repressão. Um modelo que criou uma indústria que consome bilhões de dólares.
E o resto do mundo ocidental seguiu o modelo norte-americano, criado em grande parte por estas duas jóinhas de criaturas. Pessoas que, convenhamos...se fossem seus filhos você se orgulharia deles ???

E cá estamos...70 e poucos anos depois, discutindo o óbvio fracasso absoluto de tal modelo.

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