terça-feira, 8 de setembro de 2009

Sem alarido

Chuva, vidro embaçado, pele úmida, rádio ligado.
Telefone mudo, alma dolorida, rasgada, penitente.
Estupro consentido, sem motivo ou razão aparente.
Ausente presença, ainda assim indulgente.

Sem passado, calado e atrasado.
Sem motivo, vivo.
Sem lembranças, persistente,
alma no milho, castigo.

Outdoors, neons coloridos,
espelhos d'água, rasos.
Asfalto molhado, artérias entupidas,
automóveis parados, irados.

Semáforo no vermelho, vidros cerrados.
Olhar parado e suplicante,
sem brilho, vazio e distante.
Rima desnescessária, destoante.
Amargor de fel intenso
café sem adoçante.

Um calmante a mais, canalha e seco,
inconfesso desejo amortecido,
entorpecido e indecente,
sem partida nem chegada,
encurralado no beco.

Barba mal feita, desamor.
Aqui e agora saudade.
Casa vazia, roupas atiradas,
amarrotadas, suadas e encharcadas.
Água do parto que não houve.
Vazio que já faz idade.

E o peito oco, sufoco.
Surdo lamento anônimo,
dor sem sinônimo.
pagamento sem troco.

Áridas lágrimas, invisíveis e pontiagudas,
sem origem ou endereço
chovem ao sol.
Sem correspondência, solitárias e pesadas
como o fardo de Judas.

E sem que se perceba ou entenda,
tarde demais.
Um seco estampido.
Alguém mais foi esquecido,
sem alarido.

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