Paty Lights e os Eremildos

A fama desde sempre foi o horizonte perseguido por Paty Lights, pseudônimo usado por Eremilda, cujo nome fôra dado por sua mãe em homenagem a Eremildo, o idiota, personagem criado por Elio Gaspari. É ou não incrível como as mães parecem ter uma certa capacidade premonitória a respeito dos desígnios de seus rebentos ? Com Dona Eufrásia não foi diferente, embora Paty discordasse. Se bem que Paty não era exatamente um projeto de idiota, apenas seu objetivo de tornar-se uma celebridade a qualquer preço revelava sua natureza fútil. Mas seus dotes intelectuais não eram nada desprezíveis.

Sua história começou cedo. Há quem diga que quando Eremilda nasceu, não chorou. Muito antes pelo contrário, ao ver todas aquelas luzes da sala de cirurgia ficou em pé e, colocando a mãozinha direita sobre o ventre, flexionou a parte superior de seu pequeno corpo como que agradecendo ao ar de perplexidade dos presentes, que supunha serem ovações pelo grande espetáculo, que julgara ter sido, sua estréia no mundo. Eremilda era assim, humilde como poucos.

Desde cedo teve a clarividência de que seus objetivos não seriam alcançados com esse nome, menos pela associação ao personagem idiota de Gaspari e mais pela falta do que chamava de glamour, ou mesmo de um nome que deixasse claro que os holofotes deveriam ficar direcionados à ela o tempo todo, ou ainda, que em festas de final de ano quando lhe desejassem muita luz pudesse, dando de ombros, responder: "obrigado, mas isso já tenho !".

Já no último ano da pré-escola, aos seis anos de idade, Paty já dava mostras a que vinha ao convencer a todos da necessidade de que fosse realizada solenidade de formatura com direito a toga, convites sofisticados, luzes, vídeos, orador e tudo o mais. Nem é preciso dizer que, graças a sua grande capacidade de persuasão, a honra de ser a oradora da turma coube a ela. E Paty era mestre nesta arte, muito embora suas formas de convencimento não fossem fundamentadas em argumentos, digamos, eticamente recomendáveis. "O que importa é alcançar os objetivos", dizia ela no alto de seus seis anos de sabedoria. Com base nessa máxima, a "pequena princesa" pegou os ensinamentos de Maquiavel pelo lado negativo, mesmo sem conhecer a obra do mestre de "O Príncipe", até porque sequer estava alfabetizada naquele momento. Mas Paty era assim, um fenômeno e, como tal, não se sabe como, lançou mão de "os fins justificam os meios" de Maquivel e partiu para o ataque. Para convencer os meninos a votarem nela inventou que cada um deles namorava com coleguinhas das outras turmas, chantageando silenciosamente um a um. Como todos sabem, nessa idade o sexo oposto é algo que deve ser mantido à distância. E desmentidos de nada adiantariam, ameaçava. Já às meninas bastou dizer que contaria às demais o quanto cada uma pesava.

Eleita por unanimidade, o passo seguinte foi convencer a trocarem seu nome no convite. Nada que uma série de choros histéricos não conseguisse. E quem resiste a eles ?

Mas tem dois detalhes ainda não esclarecidos. Como Paty conseguiu convencer os adultos a cederem aos seus apelos por algo tão despropositado quanto uma formatura de estudantes que simplesmente ainda não eram estudantes ? Ahááá ! Elementar meu caro Watson: Paty sabia o que todos sabem mas esquecem quando inebriados pelos encantos da paternidade, ou seja, de que os pais adoram qualquer coisa que seus filhinhos façam. Se muitos acham engraçadinho até mesmo quando seus filhos lhes dão chineladas no rosto, porque não não gostariam de vê-los como mini-formandos ? Bingo ! ponto para Paty.

Mas ainda restava uma peça para o quebra-cabeça ficar completo: convencer os proprietários da Escola de Educação Infantil. E o argumento fez os olhos dos proprietários brilharem. Disse-lhes ela: "façam uma produção hollywoodiana com muitas luzes, som, buffet, vídeos e tudo o mais e cobrem dos pais o dobro do que gastaram."

Paty Lights era ou não uma queridinha ? Com seis anos e já conhecendo e utilizando-se dos pontos fracos de cada um.

Com o êxito do empreendimento, formaturas de pré-estudantes aos poucos foram sendo institucionalizadas e atualmente são o maior sucesso. Se você não acredita, dê uma espiada nas Escolas de Educação Infantil no mês de dezembro. Com um pouco de sorte, se você passar por alguma delas na data correta, poderá verificar com os próprios olhos aquela fila interminável de automóveis de familiares dos formandos tão comum nessas ocasiões. Todos ali para prestigiar aqueles pequeninos seres já vestidos com aquelas ridículas togas e com direito a toda a pompa e circunstância de qualquer formatura. Pode isso ? Particularmente acho que não. Mas existe.

E tudo graças à Paty Lights...e à concordância dos Eremildos.